segunda-feira, 23 de abril de 2012

* Diana Grunfeld fala sobre a intervenção do professor no processo de alfabetização



Especialista em didática da alfabetização explica também que atividades promovem a formação de leitores cada vez mais competentes

Em entrevista à NOVA ESCOLA, Diana Grunfeld, especialista em didática da alfabetização e presidente da Rede Latino Americana de Alfabetização na Argentina, comenta o papel da intervenção do professor durante as atividades de reflexão sobre a escrita e explica a importância de propor atividades que permitam à turma ampliar suas estratégias de antecipação e verificação para se tornarem leitores cada vez mais competentes. 


Por que a maioria dos alfabetizados ainda não aproveita os projetos e sequências didáticas para propor a reflexão sobre a escrita? 

Diana Grunfeld: Infelizmente ainda encontramos muitos professores que realizam atividades soltas que não conversam umas com as outras. Isso ocorre porque há muita dificuldade em planejar a rotina da sala de aula a partir das modalidades organizativas, ou seja, desenvolver projetos, sequências didáticas e atividades permanentes. São poucos os que conseguem desenvolver mais de uma modalidade ao mesmo tempo, assim como equilibrar as atividades sobre o sistema de escrita e linguagem escrita ao planejar os projetos e sequências didáticas. Entender a simultaneidade é um desafio, sobretudo, para uma escola que historicamente se acostumou a fazer uma atividade por vez.


Isso exige mais dos professores? 

Diana Grunfeld: É muito mais fácil trabalhar com atividades soltas onde os alunos são solicitados apenas a copiar e memorizar. No entanto, essa prática se mostrou ineficaz, pois eles não aprendem. Fazer o planejamento a partir das modalidades organizativas e buscar o equilíbrio entre as atividades de produção de texto, leitura e reflexão sobre o sistema de escrita exige tempo e conhecimento por parte de toda a equipe pedagógica. Quando isso ocorre, o professor se sente mais seguro porque lá na frente já está tudo planejado. O grande diferencial é que dessa maneira o aprendizado é muito mais efetivo. As crianças aprendem a ler a escrever a partir das práticas sociais de linguagem.

Qual a importância de também planejar as intervenções que serão realizadas ao longo das diferentes modalidades? 
Diana Grunfeld: Não basta apenas propor uma situação didática. É preciso também planejar as intervenções que serão feitas ao longo do trabalho. Se não levarmos em conta as intervenções que precisam ser feitas, as situações didáticas, por melhores que sejam, terão seu potencial reduzido. Além do mais, também temos que mudar a cultura de só intervir quando o aluno erra. Em geral, se está tudo certo, o professor não faz nenhuma intervenção. É importante compreender que às vezes podemos solucionar um problema sem realmente ter aprendido, às vezes só decoramos ou copiamos a resposta. Isso é muito comum quando a professora pede que cada aluno escreva seu próprio nome. Por exemplo, mesmo que Manuel tenha escrito corretamente o seu nome, seja porque copiou ou memorizou, posso intervir e perguntar o que é preciso acrescentar para escrever Manuela.

O que levar em conta ao planejar as intervenções? 
Diana Grunfeld: O primeiro passo é compreender o que cada um sabe. A necessidade de um aluno em fase de fonetização é diferente de quem já utiliza letras pertinentes. Por isso, a maior dificuldade entre os professores não é saber em qual hipótese de escrita cada criança está, e sim entender o que isso significa, ou seja, como ela pensa e qual a intervenção mais adequada para fazê-la avançar. Intervir adequadamente é fundamental durante as atividades de reflexão sobre o sistema. Novamente, temos que buscar o equilíbrio para propor um problema que não seja muito difícil a ponto de desestimular os alunos, nem tão fácil que eles não se sintam desafiados. 


Como garantir a participação dos alunos?

Diana Grunfeld: Temos que construir um ambiente em que todos se sintam estimulados e confiantes em escrever da melhor forma que sabem, ainda que não seja convencionalmente. Imagine um aluno que ainda está começando no processo de alfabetização e precisa escrever a palavra caracol. Sua professora não pode ter a expectativa de que ele escreva convencionalmente. Se isso ocorrer, o resultado pode ser muito negativo, pois ele pode ficar inseguro e não querer escrever mais. É importante demonstrar que aprender leva tempo e que, naquele momento, a criança pode escrever da melhor forma que pode, pois ao longo do ano terá muitas outras atividades para refletir sobre a escrita e pensar sobre quantas e quais letras usar. Além disso, temos que garantir que a sala de aula tenha fontes de informações confiáveis. Para resolver um problema, os alunos podem e devem se apoiar em listas que foram escritas convencionalmente pelo professor e que trazem os nomes de todos da sala, os dias da semana, os meses do ano, os contos lidos e seus respectivos autores, etc.

Por que propor atividades de leitura nessa fase de alfabetização inicial? 
Diana Grunfeld: Tradicionalmente pensávamos que ler era decodificar e unir uma letra a outra. Hoje sabemos que não é assim. Permanentemente estamos antecipando e verificando para confirmar ou corrigir nossa hipótese. Por isso, ao propor a reflexão sobre o sistema temos que planejar situações que permitam aos alunos ampliar suas estratégias de antecipação e verificação. Ler é coordenar a informação baseando-se em indicadores do texto e do contexto. Por isso, não podemos deixar as crianças sozinhas em frente às letras sem que tenhamos proposto um contexto comunicativo com situações em que elas possam ler por si mesmas. Por exemplo, podemos solicitar que encontrem uma palavra específica em um dos contos lido pela professora. Essa é uma situação típica em que o aluno sabe que a informação está lá, mas não exatamente onde está. Para responder, eles terão que voltar ao texto e buscar diferentes estratégias. Nesses momentos é preciso favorecer o intercâmbio solicitando que cada um justifique a sua escolha e também ouça como os outros pensaram. Isso significa oferecer oportunidades para voltar ao texto e contar com novas possibilidades de reflexão.

Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-1/diana-grunfeld-intervencao-alfabetizacao-680401.shtml

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