quarta-feira, 11 de abril de 2012

* Letra feia é um problema?

Por que algumas crianças têm letra “bonita” enquanto outras parecem ter dificuldade para desenhar as palavras?


Aprender a escrita de mão na era do computador e da digitação ainda é importante?

Se seu filho está no Ensino Fundamental e não consegue fazer aquele traçado redondinho e perfeito das letras, não se alarme: ter letra bonita não é o essencial. Segundo os especialistas no assunto, a questão principal não é a beleza da letra. O importante é ajudá-lo a se exercitar para ter uma letra legível, para que ele possa efetivamente se comunicar por meio da escrita. "O cuidado precisa ser em ajudar a criança a ter uma letra legível, que possa ser compreendida por diferentes leitores, dentro e fora da sala de aula", diz Andrea Luize, coordenadora de núcleos de alfabetização da Escola da Vila, de São Paulo.

Uma letra legível se conquista com a prática, ressalta a neurocientista Elvira Souza Lima. "A letra da criança precisa ser compreensível para que ela e os outros leiam. E isso só se consegue com treino. A criança que desenha muito dos 3 aos 6 anos geralmente consegue educar melhor o movimento", afirma Elvira, que é doutora em Ciências da Educação pela Universidade de Sorbonne, em Paris.

Além de desenhar, exercícios de traçado e cópias de texto também ajudam a desenvolver os movimentos da mão. E para quem acha que a letra cursiva está ultrapassada por causa do uso cada vez mais freqüente da digitação e do computador, vale explicar: esse tipo de letra tem funções que vão além da comunicação escrita. A letra cursiva ajuda a criança a entender a divisão entre as palavras, a exercitar a memória e também a desenvolver habilidades para outras atividades, como o desenho de mapas e de gráficos. Veja abaixo algumas das principais dúvidas sobre o assunto e as respostas das especialistas:

- Crianças que têm dificuldade com o traçado podem ter algum problema de desenvolvimento motor?
"Poucas crianças têm efetivamente comprometimentos na área motora", diz a neurocientista Elvira Souza Lima. E, geralmente, essa dificuldade se resolve com o treino. De acordo com Andrea Luize, coordenadora de núcleos de alfabetização da Escola da Vila, quando uma criança apresenta problemas de ordem motora, isso não se manifesta somente no traçado da letra cursiva, mas em outras situações que exijam o mesmo tipo de habilidade, ou seja, que requeiram a coordenação motora fina. A coordenação motora fina é aquela que exige domínio dos músculos menores do corpo, como os dos pés e mãos, para atividades como desenhar, pintar e recortar papéis.

- A cobrança de ter "letra bonita" pode prejudicar a criança?
Fazer juízo de valor - determinando se uma letra é "bonita" ou "feia" - pode prejudicar o processo de aprendizagem, segundo Andrea Luize, coordenadora de núcleos de alfabetização da Escola da Vila. "Não dá para deixar que um tipo de letra traga sofrimento para a criança, que baixe sua auto-estima", diz ela. Andrea também ressalta que o tipo de letra de cada criança revela suas marcas pessoais: "Há crianças que investem no traçado, cuidam de escrever "bonito". Há os que o fazem mais apressadamente e que acabam descuidando um pouquinho do traçado. Enfim, existem muitas explicações para as diferentes marcas de traçado".

- É correto que crianças misturem letras bastão e cursivas na escrita?
"A partir do momento em que dominam o traçado e escrevem com fluência e legibilidade, as crianças podem optar pela letra mais confortável, assim como fazem os adultos que, inclusive, mesclam tipos de letras em suas escritas", diz Andrea Luize, coordenadora de núcleos de alfabetização da Escola da Vila.

- Os cadernos de caligrafia estão em desuso?
Segundo a neurocientista Elvira Souza Lima, os cadernos de caligrafia estão em desuso no Brasil, mas não em outros países. "O caderno ajuda a desenvolver a noção de organização espacial", diz ela, que defende também que tanto a letra bastão quanto a letra cursiva sejam ensinadas a partir dos sete anos de idade. "Aos seis ainda é tolerável, mas com menos de 5 anos, não", diz ela. Antes dos cinco anos, o que as crianças devem é desenhar livremente.

Já Andrea Luize, coordenadora de núcleos de alfabetização da Escola da Vila, diz que há outros materiais além do caderno de caligrafia para exercitar o traçado. "Na Escola da Vila usamos um material estruturado, um caderno elaborado por nós com propostas bem diversificadas para esse treino, inclusive para que não se torne enfadonho", explica ela, acrescentando que nesse material há exercícios não só para treinar o desenho de cada letra, mas para copiar trechos de poemas, de canções, dar respostas para adivinhas, etc. "Nesse sentido, somente uma ressalva: o traçado da letra nunca pode ser um obstáculo na produção de textos. As crianças já têm problemas demais ao reescrever um conto, produzir um texto informativo, etc. A letra cursiva não pode ser mais um desafio, que é o que ocorre quando as crianças ainda estão aprendendo a traçá-la e não o fazem com fluência, com agilidade".

- Na era da digitação e  da internet, qual a importância de aprender a escrever em lerta cursiva?
"Socialmente, ainda é um tipo de letra valorizado e bastante usado. Por isso, é importante que as crianças o dominem, que dêem conta de se comunicar com os outros usando essa letra. Do ponto de vista didático, o uso da cursiva pode ajudar as crianças a refletir sobre a necessária segmentação entre as palavras e sobre a própria ideia de palavra", diz Andrea Luize, coordenadora de núcleos de alfabetização da Escola da Vila. A neurocientista Elvira Souza Lima concorda. Segundo ela, a letra cursiva é importante para a educação do movimento e seu exercício ajuda o aluno a desenvolver habilidades que serão usadas em outras atividades além da escrita, como o desenho de mapas. É um exercício que também ajuda a criança a dar suporte à memória, a entender significados. "É muito mais do que simplesmente fazer a letra cursiva", diz ela.

- O tipo de letra de cada pessoa, de cada criança, pode ser considerado uma característica sua?
"A escrita é uma manifestação gráfica da pessoa, traz em si sua identidade", explica a neurocientista Elvira Souza Lima. "Há sempre uma pessoa por trás de um texto escrito. Por isso é tão importante apresentar as várias formas de escrita. Depois a pessoa escolhe pela que melhor lhe convier", diz ela.



Nenhum comentário:

Postar um comentário